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sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

1 CORÍNTIOS


1 CORÍNTIOS

Corinto
A península do Peloponeso, no Sul da Grécia, é um território montanhoso unido ao resto do país por um istmo curto e estreito. Na época do Novo Testamento estava sob a administração romana, como parte da província da Acaia, cuja capital, Corinto, estava situada a poucos quilômetros a sudoeste do istmo.

Ao longo da sua existência, Corinto conheceu o esplendor e a miséria. No ano 146 a.C., esteve a ponto de desaparecer, arrasada pelos romanos; mas, um século depois, no ano 44 a.C., Roma mesmo cuidou para que a cidade fosse reconstruída e constituída como a residência do governador da província.

 Esse último dado ficou registrado com exatidão em At 18.12-18, onde se diz que o procônsul Lúcio Júnio Gálio governava a Acaia quando Paulo chegou ali na sua segunda viagem missionária.

Corinto tinha uma dupla saída para o mar: para o Adriático pelo porto de Lequeo, e para o Egeu pelo de Cencréia (cf. At 18.18 e Rm 16.1). Essa privilegiada situação geográfica trazia não poucos benefícios à cidade, pois os dois portos eram muito freqüentados pelos barcos que faziam as rotas comerciais através dos dois mares.

A população de Corinto, estimada naquela época em cerca de 600.000 pessoas, incluía mercadores, marinheiros, soldados romanos aposentados e uma elevadíssima proporção de escravos (por volta de 400.000). Corinto era, além disso, um centro de incessante afluência de peregrinos, que vinham de lugares distantes para adorar às diversas divindades que tinham um santuário nela.

A cidade, famosa pela sua riqueza e cultura, era conhecida também pela corrupção moral dos seus habitantes e pela libertinagem que dominava os costumes da sociedade. 

É possível que muitas das críticas que lhe faziam fossem exageradas, mas certamente a má reputação de Corinto, fomentada por causas tão conhecidas como a prostituição sagrada no templo de Afrodite, era notória em toda a bacia do Mediterrâneo.
A igreja de Corinto
Naquele ambiente, a existência de uma pequena comunidade cristã, composta na sua maior parte por pessoas simples, de origem gentia (1.26; 12.2) e de recente conversão, se via submetida a fortes tensões espirituais e morais.

O anúncio do evangelho havia sido bem acolhido desde o princípio, quando Paulo, provavelmente no início da década de 50, chegou a Corinto vindo de Atenas. Durante “um ano e seis meses” (At 18.11), permaneceu na cidade, dedicado à proclamação da fé em Jesus Cristo (At 18.1-18).

As primeiras atuações do apóstolo, segundo o seu costume, visavam travar relacionamento com os judeus residentes (At 18.2,4,6,8); mas a oposição de muitos deles logo o levou a dedicar os maiores esforços à população gentia (At 18.6).

Parece que o trabalho do apóstolo, durante o tempo relativamente longo em que permaneceu na capital de Acaia, visava acima de tudo lançar os fundamentos para que outros depois dele, como Apolo (1.12), pudessem continuar anunciando o evangelho na região do Peloponeso (3.6-15).
Data e lugar de redação
A Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios (= 1Co) foi escrita em Éfeso, onde, segundo At 20.31, Paulo viveu três anos, provavelmente entre 54 e 57.

 Enquanto estava ali, os crentes da congregação fizeram chegar a ele, possivelmente por meio de Estéfanas, Fortunato e Acaico (cf. 16.17), algumas consultas, às quais respondeu com a presente carta (cf. as passagens que começam em 7.1,25; 8.1 e também 10.23; 11.2; 12.1; 15.1).
Propósito
Mais ou menos na mesma data, algumas pessoas “da família de Cloe” informaram ao apóstolo (1.11) sobre a difícil situação que estavam atravessando os crentes de Corinto. Impelidos pela fanática adesão pessoal de uns a Paulo e de outros a Pedro ou a Apolo (1.12; 3.4), haviam posto em grave perigo a unidade da igreja.

Além disso, os antecedentes pagãos da maioria daqueles irmãos continuavam pesando na conduta de alguns, e a corrupção geral, característica da cidade, era influente também na congregação, de modo que, inclusive no seu seio, se davam casos de imoralidade que exigiam ser imediatamente corrigidos.
Conteúdo e estrutura
Paulo começa esta carta abordando o problema das divisões internas, ameaça que caía sobre a comunidade cristã como um sinal da incompreensão e esquecimento de determinadas afirmações básicas da fé: que a Igreja é convocada à unidade de pensamento e de parecer (1.10-17; cf. Jo 17.21-23; Ef 4.1-6; Fp 2.1-11); que a única verdadeira sabedoria é a que “Deus preordenou... para a nossa glória” (1.18—3.4) e que somente Cristo é o fundamento da nossa salvação (3.5—4.5; cf. 1Tm 2.5-6).

Em seguida, trata de orientar os seus leitores sobre outros males que já estavam presentes na igreja, mas cujo progresso devia ser impedido sem perda de tempo: uma situação incestuosa consentida pela congregação (5.1-13), questões judiciais surgidas entre os crentes e promovidas perante juízes pagãos (6.1-11), comportamentos sexuais condenáveis (6.12-20) e atitudes indignas entre os participantes do culto, especialmente na Ceia do Senhor (11.17-22,27-34).

Junto com todas essas instruções, a carta contém as respostas do apóstolo às perguntas dos coríntios relacionadas com o matrimônio cristão e o celibato (7.1-40), com o consumo de alimentos que antes de sua venda pública haviam sido consagrados aos ídolos (8.1-13; 10.25-31) ou com a diversidade e o exercício dos dons outorgados pelo Espírito Santo (12.1—14.40).

Outros textos, relacionados com questões doutrinárias e de testemunho cristão, incluem admoestações contra a idolatria (10.1—11.1) e considerações sobre os enfeites das mulheres no culto (11.2-16) e sobre a instituição da Ceia do Senhor (11.23-26). 

Notáveis pela sua beleza e a sua profundidade de pensamento são o poema de exaltação do amor ao próximo (12.31b—13.13) e a extensa declaração sobre a ressurreição dos mortos (15.1-58).

O corpo central de 1Coríntios, que tem como prólogo uma saudação e uma apresentação temática de caráter geral (1.1-9), conclui com um epílogo que contém breves indicações acerca da oferta para a igreja de Jerusalém, mais as saudações de costume e notas pessoais (16.1-24)                                            Esboço:








Prólogo (
1.1-9)
1. Divisão e escândalo na igreja de Corinto (1.10—6.20)
a. Divisões internas na igreja (1.10—3.23)
b. Correta compreensão do ministério apostólico (4.1-21)
c. Um caso de incesto (5.1-13)
d. Questões judiciais entregues a juízes pagãos (6.1-11)
e. Problemas de imoralidade (6.12-20)

2. Resposta às consultas da igreja de Corinto (7.1—15.58)
a. Matrimônio e celibato (7.1-40)
b. Alimentos consagrados a ídolos e a liberdade cristã (8.1—11.1)
c. Desordem no culto público (11.2-34)
d. A questão dos dons espirituais (12.1—14.40)
e. A questão da ressurreição (15.1-58)
Epílogo (16.1-24)



Sociedade Bíblica do Brasil: Bíblia De Estudo Almeida Revista E Corrigida. Sociedade Bíblica do Brasil, 2002; 2005, S. 1Co

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

ROMANOS


                   ROMANOS
      
Roma
Os mais antigos dados históricos que existem hoje sobre as origens da cidade de Roma remontam ao séc. VIII a.C. 

Naquela época, começaram a povoar-se as sete colinas vizinhas ao rio Tiber, sobre as quais, em um futuro ainda longínquo, haveria de erguer-se a capital do mundo então conhecido.

Aqueles primitivos assentamentos humanos cresceram pouco a pouco, uniram-se entre si, estabeleceram princípios de convivência e assentaram as bases que um dia conduziriam à instauração de um sistema de governo coletivo, conforme o modelo de república que caracterizou Roma entre os séculos VI e II a.C.

À medida em que se afirmava a unidade do Estado, crescia a sua capacidade econômica e militar, de onde se derivou também um forte anseio de possessão territorial que impeliu Roma à conquista de países e à sujeição de pessoas de muitas nacionalidades e línguas diferentes. 

Com o passar dos anos, se fez dona de toda a bacia do mar Mediterrâneo e dos seus territórios circunvizinhos e ainda muito mais além.

Na época de Jesus, a república de Roma havia se transformado em império. E foi em pleno coração daquele Império Romano, em parte admirável e em parte cheio de conflitos e moralmente degradado, onde surgiu a igreja para a qual o apóstolo Paulo escreveu esta epístola, sem dúvida a mais importante das suas do ponto de vista teológico.
Propósito
A Epístola de Paulo aos Romanos (= Rm) tem enriquecido o testemunho de gerações de crentes ao longo da história.

 A profundidade de pensamento do autor põe em destaque a sua confiança na graça de Deus e manifesta a sua vocação e o fervor que o anima; um fervor evangelizador que inspirou acontecimentos decisivos para a história e a cultura da humanidade.

Quando o apóstolo Paulo redigiu esta epístola, a mais extensa de todas as suas, ainda não tivera oportunidade de visitar os crentes residentes em Roma (1.10-15). 

Contudo, a extensa lista de saudações do cap. 16 parece provar que já naquela época contava com não poucos relacionamentos e afetos entre aquele grupo de homens e mulheres que, em pleno coração do império, haviam sido “chamados” para serem “de Jesus Cristo” (1.6).

 Não obstante, é esse conhecimento que e o apóstolo demonstra ter de muitos crentes de uma igreja que nunca havia visitado que tem levado alguns estudiosos a pensarem que o cap. 16, originalmente, não fizesse parte desta carta. Julgam que pode pertencer a outra, possivelmente dirigida a Éfeso, onde Paulo havia estado em mais de uma ocasião e, pelo menos uma vez, durante um longo período de tempo (ver a Introdução a Efésios).

Paulo, muitas vezes, havia se proposto a viajar para Roma (1.9-10,13,15; 15.22-23), para ali anunciar o evangelho (1.15) e repartir com os irmãos “algum dom espiritual”, para que reciprocamente se confortassem “por intermédio da fé mútua” em Cristo (1.11-12). Mas é agora, ao considerar a Espanha como campo do seu imediato trabalho missionário, que vê chegar também a oportunidade de realizar a desejada visita (15.24,28).

Nessas circunstâncias, o apóstolo pareceu entender que a sua presença em Roma contribuiria para superar algumas tensões que estavam surgindo na igreja. Passagens como 11.11-25 e 14.1—15.6 revelam que pairava sobre a comunhão fraternal um sério perigo de divisão, por causa de rivalidades surgidas entre crentes de procedência diferente: uns do Judaísmo e os outros do paganismo (cf. a este respeito At 6.1; Gl 1.7; 2.4).
Data e lugar de redação
Esta epístola foi escrita, provavelmente, por volta do ano 55, durante uma permanência de Paulo na cidade de Corinto. Tanto pelo seu conteúdo como pelas suas características literárias, se assemelha à epístola enviada às igrejas da Galácia. As duas pertencem à mesma época e revelam interesses doutrinários semelhantes. 

O que não se sabe é qual delas foi escrita primeiro. Por isso, alguns vêem em Romanos uma exposição ampliada, muito refletida e serena, da breve epístola aos Gálatas, enquanto que outros pensam que Gálatas é uma espécie de síntese polêmica e veemente da epístola aos Romanos.

De qualquer forma, ambos os escritos devem ser considerados a partir de uma perspectiva comum, posto que, em definitivo, se trata da transmissão de uma mesma mensagem que inclui conceitos fundamentais idênticos: o domínio do pecado sobre todos os seres humanos (Rm 1.18—2.11; 3.9-19, cf. Gl 3.10-11; 5.16-21), a incapacidade da Lei de Moisés para salvar o pecador (Rm 2.12-29; 3.19-20; 7.1-25, cf. Gl 2.15-16; 3.11-13,21-26), a graça de Deus revelada em Cristo (Rm 1.16-17; 3.21-26, cf. Gl 2.20-21; 4.4-7), a justificação pela fé (Rm 3.26-30; 4.1—5.11, cf. Gl 2.16; 3.11,22-26; 5.1-6) e os frutos do Espírito (Rm 8.1-30, cf. Gl 5.22-26).
Conteúdo e estrutura
Quanto à estrutura literária, Romanos se divide em duas partes principais: a primeira é propriamente doutrinária (1.16—11.36); a segunda, de exortação (12.1—15.13).

 Contém, além disso, uma introdução rica em conceitos teológicos (1.1-15) e uma conclusão que completa o texto com um grande número de notas de caráter pessoal (15.14—16.27).

Os temas tratados em Romanos são teologicamente densos, mas Paulo os expõe de um modo ameno e torna fácil a sua leitura introduzindo vários recursos estilísticos: diálogos, perguntas e respostas, citações do Antigo Testamento, exemplos e alegorias. 

A seção doutrinária é a mais extensa. Paulo reflete sobre o ser humano, dominado pelo pecado e incapaz de salvar-se pelo seu próprio esforço.

 Afirma, como o salmista (cf. Sl 14.1-3; 53.1-3), que todos, tanto judeus como gentios, “pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (3.23); que somente Deus pode salvar os pecadores e que o faz por pura graça, “pela redenção que há em Cristo Jesus” (3.24).

O tema da fé e a sua importância para a reconciliação do pecador com Deus se estende de 3.21 a 4.25

Em uma linguagem jurídica magistralmente utilizada, o apóstolo introduz termos como “lei”, “mandamento”, “transgressão”, “justificação”, “graça” e “adoção”. 

Mas os apresenta sob a nova luz da liberdade e paz oferecidas em Cristo ao pecador que se arrepende, com quem Deus quis estabelecer um definitivo relacionamento de amor e de vida (5.1—8.39).

Os caps. 9 a 11 constituem uma unidade temática que se destaca do resto da epístola. Aqui, Paulo nos revela a sua íntima preocupação porque Israel não chegou a compreender que “o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê” (10.4).

 No entanto, o apóstolo está convencido de que Deus nunca abandonará o seu povo escolhido (11.1-2), visto que “os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento” (11.29). Israel será restaurado (11.25-28), porque Deus terá misericórdia dele como também teve dos gentios (11.11-24,30-32).

A segunda parte de Romanos começa em 12.1. É uma exortação para viver segundo a lei do amor, um apelo à fé e à consciência cristã. 

Todo crente é chamado a pôr em prática essa lei, seja dentro de uma congregação de fiéis (12.3-21; 14.1—15.13), seja nos relacionamentos com a sociedade civil (13.7-9) ou com as autoridades e altas magistraturas do Estado (13.1-7).

A fé precisa manifestar-se na autenticidade do amor. Portanto, a fé se opõe a qualquer atitude de soberba pessoal ou coletiva. A jactância e o menosprezo ao próximo não correspondem com a solidariedade, que resulta do amor e á testemunho dele (12.1—15.13).

A partir de 15.14 até 16.27 se desenvolve o epílogo da epístola. É uma extensa e cativante relação de observações pessoais, recomendações e saudações dirigidas a uma série de fiéis, de muitos dos quais se faz constar as virtudes que os adornam.

 Paulo une às suas as saudações de alguns dos seus colaboradores, como Timóteo e Tércio, que escreveu a epístola, e também de alguns parentes, como Lúcio, Jasom e Sosípatro (16.21-22). 

O cap. 16 não registra somente saudações e recomendações, mas dedica também as suas últimas palavras para animar os seus leitores e para afirmar a vitória reservada aos que confiam no poder de Deus (“E o Deus de paz esmagará em breve Satanás debaixo dos vossos pés”, v. 20).

Finalmente, uma esplêndida doxologia encerra a epístola com chave de ouro (16.25-27).
Esboço:
Prólogo (1.1-15)
1. Salvação somente pela fé (1.16—11.36)
a. Anúncio do tema: O justo viverá pela fé (1.16-17)
b. A indesculpável pecaminosidade humana (1.18—3.20)
c. Justificação mediante a redenção efetuada por Cristo (3.21—4.25)
d. A nova vida de liberdade do justificado pela fé (5.1—8.39)
e. A incredulidade de Israel (9.1—11.36)
2. Exortações: A justificação pela fé aplicada à nova vida (12.1—15.13)
a. Em amor autêntico (12.1-21)
b. Em submissão às autoridade instituídas por Deus (13.1-14)
c. Sem menosprezo ao irmão mais fraco (14.1—15.13)
Epílogo (15.14—16.27)
Os planos evangelísticos do apóstolo (15.14-33)
Saudações, recomendações e doxologia final (16.1-27)



Sociedade Bíblica do Brasil: Bíblia De Estudo Almeida Revista E Corrigida. Sociedade Bíblica do Brasil, 2002; 2005, Rm

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

ATOS DOS APÓSTOLOS


       ATOS DOS APÓSTOLOS

      Autor e propósito final do livro
A única obra que em todo o Novo Testamento se apresenta como continuação de outra é Atos dos Apóstolos (= At).

 O autor, identificado tradicionalmente com Lucas (ver a Introdução a esse Evangelho), não quis dar por concluído no seu primeiro livro o relato “dos fatos que entre nós se cumpriram” (Lc 1.1), mas, no seu segundo volume, recompilou a informação que teve ao seu alcance sobre os inícios da propagação do Cristianismo.

Praticamente, Atos começa no ponto em que termina o terceiro Evangelho. Depois de uma introdução temática (1.1-3), que inclui a dedicatória a Teófilo (cf. Lc 1.3), o autor situa a narração no cenário de Betânia (Lc 24.50), onde à vista dos seus discípulos “foi elevado às alturas, e uma nuvem o recebeu, ocultando-o a seus olhos” (At 1.9).
Conteúdo
O acontecimento da ascensão aparece marcado para Lucas pela afirmação de Jesus “e ser-me-eis testemunhas” (1.8). Sob o signo dessas palavras irá desenrolar-se a história inteira da Igreja nascente. 

A ascensão assinala o começo da atividade do Espírito Santo na Igreja, a qual é edificada sobre o fundamento da fé em Cristo e guiada adiante até a sua plenitude gloriosa de novo povo de Deus.

O título Atos dos Apóstolos, que não foi posto no texto pelo seu próprio autor, mas pela Igreja do séc. II, não corresponde em todos os seus aspectos ao conteúdo da narração. 

Com efeito, o livro só ocasionalmente ocupa-se com o grupo dos Doze (incluído já Matias, de acordo com 1.26). A sua atenção não se dirige aos apóstolos em geral, senão em particular a determinados personagens, especialmente ao apóstolo Pedro e, sobretudo, a Paulo.

Os trabalhos e discursos de Pedro e de Paulo são os principais centros de interesse de Lucas. 

O seu propósito é documentar os primeiros passos da difusão do evangelho de Jesus Cristo e o modo pelo qual o Espírito de Deus dava impulso naquele tempo ao crescimento da Igreja “tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra” (1.8).

Jerusalém é o lugar onde começa a história da atividade apostólica. Ali é onde se congrega e organiza a Igreja-mãe; ali se dão as primeiras manifestações do Espírito Santo; ali morre Estêvão, primeiro mártir da fé cristã; ali se escutam as primeiras mensagens evangélicas, e dali partem os primeiros enviados a anunciar fora dos limites palestinos a mensagem da salvação.

 A esses acontecimentos e ao desenvolvimento da comunidade de Jerusalém aparece estreitamente vinculada a pessoa de Pedro.

No entanto, mais interessado ainda se mostra Lucas na figura de Paulo, o missionário, o homem que foi capaz de renunciar aos seus antigos esquemas mentais e religiosos para, de todo o coração, proclamar a Jesus Cristo diante de quantos quiseram escutá-lo (At 13.46; ver Rm 1.16; 1Co 9.20; Gl 2.7-10). 

A fé e a vitalidade de Paulo representam para Lucas a energia interna do Evangelho, que em breve e de forma irresistível haveria de alcançar o coração do Império Romano. 

A chegada de Paulo a Roma (28.11-31) põe ponto final a Atos dos Apóstolos, um drama velozmente desenrolado que partiu com ímpeto de Jerusalém poucos anos antes.

Divisão do livro
O conteúdo do livro admite diversas análises, baseadas nos movimentos dos seus personagens mais importantes. A partir dessa perspectiva histórico-geográfica pode-se dividir o relato em três etapas diferentes:

Primeira etapa: Jerusalém (2.1—8.3). Depois da ressurreição e da ascensão de Jesus ao céu (1.4-11), Jerusalém é cenário da formação do núcleo cristão mais antigo da história (1.12-26). Ali veio sobre os discípulos o Espírito Santo no dia de Pentecostes (2.4), e ali se deram os primeiros passos para a organização da Igreja (2.41—8.3).

Segunda etapa: Judéia e Samaria (8.4—9.43). A perseguição contra os cristãos desencadeada após o martírio de Estêvão (6.9—7.60) obrigou muitos deles a saírem de Jerusalém e a se dispersarem “pelas terras da Judéia e da Samaria” (8.1). Esse fato veio a favorecer a propagação do evangelho, que já por aquele tempo havia alcançado diversos pontos da Síria e Palestina (4.4-6,25-26; 9.19,30-32,35-36,38,42-43).

Terceira etapa: “até aos confins da terra” (10.1—28.31). (a) Deus, no caminho de Damasco, havia chamado Saulo de Tarso (7.58; 8.1,3; 9.1-30; 22.6-16; 26.12-18), para fazer dele “um vaso escolhido para levar” o nome de Jesus aos gentios (9.15).

 Por outro lado, os crentes “que foram dispersos pela perseguição que sucedeu por causa de Estêvão caminharam até à Fenícia, Chipre e Antioquia” (11.19), e desse modo abriram-se as portas ao evangelho em lugares até então totalmente pagãos.

(b) Paulo empreende a sua atividade missionária. No transcurso de três viagens, percorre territórios do sul e oeste da Ásia Menor, penetra na Europa pela Macedônia e chega até a Acaia (13.1—14.28; 15.36—18.22; 18.23—20.38). 

A sua passagem está marcada pelo nascimento de novas igrejas, de que ele é, primeiro, fundador, e depois, mentor e conselheiro e com as quais mantém um cordial relacionamento, seja em pessoa ou por escrito.

(c) Ao término do seu terceiro percurso apostólico, regressa a Jerusalém (21.1-15), em cujo templo é preso (21.27-36).

 Os últimos caps. de Atos descrevem com especial detalhe os incidentes da viagem de Paulo a Roma, aonde o conduzem para ser julgado perante o tribunal imperial, a que ele havia apelado fazendo uso do direito que lhe outorgava a cidadania romana (22.25-29; 23.27; 25.10-12).

 O livro conclui com a chegada do apóstolo a Roma e o início da sua atividade naquela cidade (28.14-31).

O autor de Atos manifesta-se em ocasiões como testemunha presencial do que está relatando.

 A narração utiliza então a primeira pessoa do plural: “nós” (16.10-17; 20.5—21.18; 27.1—28.16), de modo que o escritor inclui-se entre as pessoas que acompanham o apóstolo no seu trabalho.
Estilo literário
O estilo de Atos é elegante e rico em vocabulário. Lucas possui um notável domínio da gramática e dos recursos lingüísticos do grego de seu tempo (koiné) e, inclusive, do clássico (ático). 

Talvez o conjunto da sua obra seja representativo dos primeiros esforços realizados para apresentar a fé cristã aos níveis mais cultos da sociedade romana.
Lugar e data da composição
Não existem dados que permitam precisar a data nem o lugar da composição deste livro. Muitos pensam que foi publicado uns vinte e cinco ou trinta anos depois da morte de Paulo, aproximadamente durante a década dos anos oitenta.
Esboço:
Prólogo (1.1-26)
1. Pregação do evangelho em Jerusalém (2.1—8.3)
a. O primeiro Pentecostes cristão (2.1-42)
b. A vida dos primeiros cristãos (2.43—5.16)
c. As primeiras perseguições (5.17—8.3)
2. Pregação do evangelho em Samaria e Judéia (8.4—9.43)
3. Pregação do evangelho aos gentios (10.1—28.31)
a. Atividade de Pedro (10.1—12.25)
b. Primeira viagem missionária de Paulo (13.1—14.28)
c. A assembléia de Jerusalém (15.1-35)
d. Segunda viagem missionária de Paulo (15.36—18.22)
e. Terceira viagem missionária de Paulo (18.23—20.38)
f. Prisão de Paulo e viagem a Roma (21.1—28.31)



Sociedade Bíblica do Brasil: Bíblia De Estudo Almeida Revista E Corrigida. Sociedade Bíblica do Brasil, 2002; 2005, At